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segunda-feira, 21 de junho de 2010

Carta ao COB

Abaixo a carta que enviei a alguns dirigentes do Comitê Olímpico Brasileiro.

Certo ou não, prefiro errar pela ação do que pela omissão de ver as coisas no taekwondo brasileiro acontecerem de forma ilegal e ficar calado.

Marcus Rezende


Ano passado ingressei com um pedido no Ministério Público Federal para que investigassem e propusessem uma ação na Justiça Federal contra a Confederação Brasileira de Taekwondo, em razão de a entidade se estabelecer como responsável pelos exames de graduação de faixas-pretas em todo o país em parceria com as 27 federações estaduais. A entidade oficializou nos estatutos das entidades de administração ganho financeiro por meio de taxas de exames com exclusividade àqueles que os presidentes das entidades indicassem como examinadores oficiais. Sendo que os indicados são eles próprios.

Pelo Estatuto, somente os presidentes podem indicar as pessoas que vão compor as bancas examinadoras e receber as taxas de exames. Eles alegam a necessidade de um controle técnico dos faixas pretas que estão se formando. Uma pseudopreocupação que esconde a clara intenção de obtenção de lucro com as taxas de exames.

O resultado desta situação anacrônica está se configurando em um grande afastamento de praticantes de taekwondo das entidades de administração.

Entendendo o surgimento das taxas de exame

Essas taxas concebidas como honorários foram criadas pelo fundador do taekwondo, quando vislumbrou difundir mundialmente a modalidade e mandar os peritos coreanos para diversos países do mundo, na década de 60. Ele sabia que, como profissional de uma modalidade marcial, na velhice, não teriam a mesma saúde para ensinar da mesma forma. Os exames de faixa, então, foram criados como uma forma de pecúlio, visando uma aposentadoria a esses mestres, a ser exercitada de forma distributiva conforme a graduação de cada instrutor, professor ou mestre. Uma receita da qual o faixa-branca que no futuro viesse a fomentar a modalidade também usufruiria em patamares condizentes com a graduação que obtivesse.
Para um entendimento mais claro, quando os coreanos chegaram ao Brasil na década de 70, trouxeram essa instituição chamada exames de faixa, mas não fizeram essa distribuição. Os alunos desses mestres ao se formarem faixas pretas - e darem início ao fomento da modalidade -, ensinando em academias, escolas e clubes, ainda não tinham graduação para examinar os próprios alunos. Quem desempenhava este papel era o próprio mestre coreano, o qual recebia integralmente as taxas sugeridas por eles próprios sem repassar um tostão ao professor-discípulo.

Entidades desportivas respondendo

No início da década de 80, ao criarem as primeiras entidades desportivas e perceberem que os alunos de ontem se tornariam mestres em futuro próximo (e que, portanto, exigiriam as mesmas prerrogativas), trataram de atrelar a questão dos exames aos estatutos, fazendo dos dirigentes os donos dos exames.
Atualmente, todos os professores e mestres do Brasil, que não são dirigentes, ficam impedidos de examinar. Estão reféns de presidentes de federações. Diversos professores e mestres que fazem trabalhos excelentes na formação de atletas estão se vendo obrigados a entregar seus alunos para serem examinados por tais dirigentes, como condição para que possam se registrar nas respectivas federações e disputarem as competições seletivas, visando fazer parte da Seleção Brasileira.
A conseqüência desse disparate se constata na evasão enorme de atletas. Grande parte dos professores e mestres do Brasil está deixando de lado o Olimpismo para se dedicar integralmente à arte marcial pura e simplesmente.
O COB precisa realmente saber o que está acontecendo para perceber o porquê da diminuição na quantidade e na qualidade dos atletas de taekwondo do Brasil. Alguns presidentes de federação atuam como verdadeiros tiranos e impedem que o taekwondo competitivo se desenvolva.
Muitos técnicos estão abdicando de preparar atletas, por não aceitarem essa situação. Em tempos de preparação para 2016, estamos vivenciando um total desinteresse por parte de professores e mestres em fazerem de seus alunos praticantes competidores. Isso tudo por conta dessa anomalia que se transformou os exames de faixa no Brasil.
Tais exames de faixa atrelados aos estatutos impedem o desenvolvimento do taekwondo olímpico. E é simples de entender: os professores e mestres do país não estão mais se interessando em preparar atletas para competir. E isso é denoso para o Olimpismo.

Desde já, agradeço a atenção dispensada, na certeza de que o Comitê Olímpico Brasileiro saberá como equacionar tal situação cuja autonomia é da própria CBTKD, mas cujas sequelas acabam respingando um pouco no COB, já que o esporte olímpico TAEKWONDO está sendo francamente prejudicado.

Marcus Rezende

Um comentário:

Professor Junior disse...

Como sempre, sábias palavras. É só tomar como exemplo de outras federações onde não haja nível de graduação. A coisa podia ser dividida na administração da federação. Atleta é uma coisa e faixa preta professor é outra. Tinha que ter isso. Se um aluno que tenha o genótipo para lutador ingressasse na sua academia, ele teria que esperar tantos anos treinando coisas o qual não seria interessante e acabaria desistindo da modalidade. Já se, desde a sua descoberta como talento competitivo, fosse treinado somente técnica e tática competitiva, pouparia tempo e seria mais um atleta de alto rendimento para o esporte. Mas e os exames? Era só ele pagar uma taxa para se filiar somente como atleta e quando sua vida no esporte, uma vez que o tkd agrega arte marcial e esporte, tivesse acabada, passaria por todo processo de instrução que havia pulado. Mas isso é só uma ideia que deve ser estudada mais detalhadamente.